quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Azulona


 

Ave de terra firme,

Passos de beija-flor

Floresta que venta sem rumo

Sorriso que o canto aprumou.

Galhos e folhas verdes,

Pisas tranquila, Aquarela

Plumagem leve... caminha

Gosto azul, cinza-ardósia.

Me encanta e confunde

O que estampa na face?

Singela, teus olhos passeiam

Esférica linhagem cinegética

Aguça e invade meu leito,

O peito explode e se abre

Pousaria por horas em seu sossego

Remeteria um abraço de encantamento

No suave recanto de sua voz...

Noturna, endêmica e voraz!

 

(Iberê Martí)

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

A Águia


 

Ao olhar do desespero

Sob os olhos de Zaratustra

Profeta parido pro mundo,

Feito fel, de amor e Arte

 

Amargo teu observar,

Livre ave de rapina

E se contenta em olhar,

As sutilizes da fera

 

Animal que nos domina,

Instintos traiçoeiros

Gota d’água é Esperança,

Colírio dos amaldiçoados

 

Vê o mundo desnudo,

Correndo sem um destino

Oprimidos opressores, oprimindo

A correnteza nos leva

 

Pra algum lugar distante

Estandarte de Saudade

O passaporte, uma Nova Era

E observa a Águia, solitária

 

O coletivo nos devora

Divisa que nos confunde

Aos que sonham primavera,

Protegendo seus latifúndios

 

A Águia observa os Artistas

Admira os poetas, os andarilhos

Que vivem livres de escolhas,

E não prometem um caminho!

 

(Iberê Martí)

Menino do Interior


 

Uma vez eu fui menino,

E sonhei com liberdade

Hoje só resta saudade,

do menino que sonhou

Peixe de cidade grande,

A canoa que virou,

Na curva do rio e disse...

Adeus sonho? menino de interior

 

Uma vez eu fui menino

Corri descalço pelo agreste

Lutava com onça, barriga d’água

Fazia banzeiro com a peste

E seguia com muita alegria,

Os pés no chão, cabeça no vento

Hoje só tenho cimento,

Qual sonho que restou? menino do interior

 

Uma vez eu fui menino

E meus sonhos foram crescendo

Usar cueca, vestir os pés

Tomar vermífugo, usar terno

Que o destino pro inferno

O menino foi morrendo, e corria

Pra ser o primeiro um dia

Quem chegou? Menino do interior

 

Uma vez eu fui menino

Capitão, cabra sem rumo

Nem por mil amores aprumo

Teus olhares são navalhas,

As línguas que cortam o vento

Bruxas, e anjos da noite

Nossos caminhos de ciganos

Soberano que ficou? Menino do interior
 
(Iberê Martí)

domingo, 21 de setembro de 2014

Às vezes eu


Às vezes eu penso que os poetas não existem.
Nunca vi nenhum vivo
Só os conheço pelos livros
Devem viver com os seres místicos,
Perto do paraíso, e longe dos locais turísticos
Mas eis que me transformo
Um poeta no frio, um poeta no escuro
Poeta vadio, poeta menino
Poeta urbano, poeta citadino
Perdido na zona rural,
Entre um velho lendo jornal ou
Revolucionário entre o bem e o mal
 
(Stéphano Diniz)

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Feira hippie



 

Meu coração é uma praça pública,

Propriedade do povo...

De faca cega, e fé sem mola

Meus olhos não usam óculos escuros,

Somente a luz me conforta.

As fases da lua já não incomodam,

[meu estado sem espirito]

Um mar morto é meu humor.

 

Meu coração é uma praça pública,

Propriedade do povo...

E quer sorrir ao lado do mágico,

Do artesão, da dançarina, do velho banguela.

Daquele cinza virtual imitando um robô,

[e entregando flores as moças]

Das crianças correndo, ou do andarilho

A feira do improviso, de gente sem pressa

 

Meu coração é uma praça pública,

Propriedade do povo...

Uma praça que é uma imagem,

Que remete aquelas pupilas verdes,

[cantarolando Bob Dylan]

Até mesmo em velórios...

Ela jura, “o sonho não acabou”

No calor tropical, no palco dos anjos

 

Meu coração é uma praça pública

Propriedade do povo...

Não quero mais usar facas,

[nem cortes com penas]

Vou caminhar junto ao abandono

[nós, que não querem ser donos de nada]

E nunca mais pretendo ver aqueles lábios,

Mas continuo ouvindo "I Want You"!!!

 

(Iberê Martí)

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Outra Galáxia


 

Meu destinatário é um endereço antigo

Meu remetente é um espaço confuso

Vivo ao contrário, ao que meu “eu” pertence

Tenho predição em tropeçar no difuso

 

Vou navegar até encontrar,

um lugar ocupado pelo imaginário:

Aonde o Mau não seja obrigatório;

Aonde o Bem não seja necessário...

E há dialética da Existência, um caminhar tranquilo!

 

Carrego muitas mentes sob minhas asas,

Algumas que sonham, outras ao contrário

Umas perambulam sem um rumo certo,

Existem Arquitetos, e também Salafrários

 

Vou navegar até encontrar,

um lugar ocupado pelo imaginário:

Aonde o Mau não seja obrigatório;

Aonde o Bem não seja necessário...

E há dialética da Existência, um porto seguro

 

Tenho muito apreço aos que vão sem pressa

Mas não desmereço aos correm sempre,

E caem, escorregam no mesmo itinerário

Abrigo maldito, ladrilho da indiferença

 

Vou navegar até encontrar,

um lugar ocupado pelo Imaginário:

Aonde o Mau não seja obrigatório;

Aonde o Bem não seja necessário...

E há dialética da Existência, um refúgio sem muro

 

Pessoas caminham rumo ao desnecessário

Vendem ilusões, e sonhos antes proibidos

Existem os proféticos como retardatários

Na vanguarda o povo, espera o prometido

 

Vou navegar até encontrar,

um lugar ocupado pelo Imaginário:

Aonde o Mau não seja obrigatório;

Aonde o Bem não seja necessário...

E há dialética da Existência, uma Consciência Nova

 

Cultivo latifúndios em meus pensamentos

Crio monocultivo com as minhas ideias

E trafego solitário sobre a existência

Se sinto carência, uso o que está na moda

 

Vou navegar até encontrar,

um lugar ocupado pelo Imaginário:

Aonde o Mau não seja obrigatório;

Aonde o Bem não seja necessário...

E há dialética da Existência, uma Utopia

 

Em Outra Galáxia...
 
(Iberê Martí)

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Fuso Horário


 

Ando encabulado pelos ponteiros

Este fuso horário que só acerta,

Relógio de parede sincronizado

Tic-tac atrasa o passo, e tropica em ti

 

Ando encabulado pelos ponteiros

Que mede horas, minutos segundos

Feito destino cigano, de pena de sorte

Tac-tic adianta o passo, e tropica em ti

 

Ando encabulado pelos ponteiros

Há cada milésimo analógico que passa

Observa a pressa de areia na ampulheta

E a cada grão que passa, tropica em ti

 

Ando encabulado pelos ponteiros

Arranca o juízo da frieza do tempo

E empresta pro mundo os seus sorrisos

Tum, tum tum Coração, e tropica em ti!
 
(Iberê Martí)

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Desempregado

 

Fui pra rua, sentei no banco da praça. Lá esqueci meu relógio... quando deparei por mim, o sol estava se pondo. Havia perdido a hora. (Há quanto tempo isso não acontecia?). Não voltei pra procurar o relógio. Então eu quis olhar o sol de perto, pelo lado de dentro da retina. Tirei o óculos. Um colibri passou, achou que era um graveto e levou no bico para construir seu ninho. Enfim, algo de útil foi feito com aqueles óculos. Nisso a noite chegou. Veio uma índia pedindo esmola, com uma criança no colo. Tirei minha camiseta e por fim aquele tecido aqueceu o peito de alguém que realmente precisava. Continuei caminhando. Passei em frente à escola de minha infância. Lá eu deixei a fórmula de bhaskara (assim mesmo, minúscula, miúda), e todos os demais (pre)conceitos que as convenções impõem...E eu comecei a caminhar mais leve. Meus passos, feito pluma, foram aprendendo a recompor tudo que eu havia aprendido esquecer com a cultura. Neste instante meu coração ficou Manoel de Barros. (E permanece ainda hoje). Foi possível, até que eu avistei a madrugada chorar na secura do sol. Vi estômatos se abrirem e se fecharem. Avistei um carcará afagar a maria-dormideira. E o sol nasceu fazendo um anel em volta da terra, sob um coral de joão-de-barro. Harmonia era tanta que a flor de ipê caiu lentamente no pé de uma paca. (Que nem se assustou, por que deverás?). Uma criança sorriu da feiura do teiú. A onça lambeu a água lentamente, animal de estimada espreita. Um galheiro tropeçou em meu caminho, deu um salto e foi se embora. Avistei uma criança correndo descalço. Tirei o sapato, larguei eles em um canto. Logo um cachorro fez dele um bumerangue. (O sapato apertado se foi, e nunca mais voltou). Senti novamente o prazer da terra úmida. Passei a mão em um punhado de barro, apertei com força, até gotejar a água exprimida. Depois lancei o torrão na água. Cuja as ondas foram se expandido em círculos perfeitos. Não havia mais em mim nenhuma necessidade de nada. Joguei fora as lembranças, as más e as boas. É essa mania de armazenar O Inútil que nos torna jabuti ao invés de aves. Tudo estava posto, contemplando o desprendimento. Como um aposentado, no mundo do dinheiro, do trabalho e da competição. Dei de ombros ao Abandono. Tu nunca mais me encontra! (Exclamei a ele). É a Liberdade pousou em minha frente. Me sorriu, e me chamou de Andarilho. Acho que ainda estou encantado, parecia até esmola... Tão bom ou melhor que não ter pra onde ir, é caminhar, caminhar e caminhar sem nenhuma esperança de chegar. Acho que os desempregados deveriam aproveitar melhor, a única e mais sublime oportunidade, que está Vida inóspita os concederá!
 
(Iberê Martí)

Me faça um Livro?


 

Alicerce mais enfadonho é o Universo rudimentar dos livros,

Abrigo vasto dos Solitários. Solidário esconderijo dos Imperfeitos

Onde tu só, sobrevoa pelo infinito, viagem entre o real e o abstrato

Há quem teme se perder, existem os que sonham não voltar

E quanto mais tu consome, maior se consome, e mais quer viajar.

Eu me perdi algum tempo, em um determinado lugar que não sei...

Se volto, se fico, se voo, se vou... se nado, se nada ou se sobrevoou
 
(Iberê Martí)

Flor de Ipê


Ipê que amarela o rosto de minha janela
Final de agosto, arremessa se em setembro
Seco, ludibria a fumaça e faz chama sem fogo
Afugenta corações, transfigura o verde/cinza
Ipê tu floresce na serra, no sul, no pantanal, no sertão és um tolo
Em um esforço sublime, lança as folhas ao leu
respira por flores, respinga no néctar da divina paisagem
Há busca mais profunda pelas raízes de infância,
e no abandono alcança a derradeira gota d’água...
Ipê que incendeia nossas terras de esperança,
E encanta até mesmo a "nobreza" dos homens sérios.
Ipê amarelo que floresce em meio essa gente seca,
mesmo sob chacota, desprezo, sarcasmo tu floresce
E resplandece aos olhos de bestas que vestem terno
Ipê branco, rosa, púrpura, lilás ou purpurina
Que alimenta a Alma, semente de forma alada e pura
voa alto no vento, pra viver de encantar e florescer pra sobreviver...
E caminhar, caminhar e caminhar, que a vida é bela!

(Iberê Martí)

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Mundo Mudo


 

As palavras que me faltam

Nas letras que eu não escrevo

Nas vozes que eu não falo

Nos silêncios que não me escutam

 

Palavras, palavras....

Cheias nos dicionários,

Saem vazias nas bocas

E se dissipam pelo Espaço

 

Um som sustenido,

que grave se expande

Um tom agudo,

que se comprime

 

Palavra de amor e de medo

Palavra de pavor, e saudade

Palavra de dor... ao pé do ouvido

Palavras de Humanidade

 

Palavras que eu invento

Vozes que eu não repito

Grito, profundo profano

Veto ao que foi escrito

 

Palavra que me crava,

Sou escravo da palavra

Da palavras seca e úmida,

com cheiro de madrugada

 

Palavras que não ouço

Palavras que não me escutam

Medo Mundo Mudo

Cheio de palavras, e vazio...

 

De quase tudo!!!
 
(Iberê Martí)